Artigo transcrito do Diário Económico: Martim Avillez Figueiredo (editorial)
Da Globalização
O Presidente da República Portuguesa publica hoje em exclusivo Ibérico (Diário Económico e Expansión) um texto em defesa da globalização.
Faz bem. Este é um dos assuntos mais sérios, juntamente com o terrorismo, que o mundo tem para discutir. E não é a dimensão económica que lhe dá relevância. É o facto, extraordinário, de dividir opiniões com a mesma intensidade com que antes se separava esquerda de direita - e com o mesmo grau de ignorância.
Numa definição muito simples, globalização traduz-se como o processo através do qual o mundo se transforma num gigantesco mercado único. Isto significa que bens, serviços, dinheiro e o próprio trabalho são transaccionados sem olhar a fronteiras - apoiados em sistemas de comunicação muito rápidos e eficazes. Mas claro, daqui pouco se depreende: enquanto uns lêem benefícios nestes conceitos (como Cavaco Silva), outros descobrem problemas (como Mário Soares). Em que ficamos? Vale a pena olhar quatro ideias.
Primeira ideia: A ideia de globalização surge quando se percebe, de facto, que circular de um lado para o outro é simples. Antes, populações divididas por duas faces da mesma montanha falavam línguas diferentes e tinham hábitos distintos. Hoje não: comem, vestem, negoceiam e sentem quase da mesma maneira. Portanto, é uma consequência normal - não uma iniciativa política.
Segunda ideia: O que confere dimensão política à globalização, portanto, é a decisão (inevitável) de avaliar as consequências dessa dinâmica natural. E aí, sim, há quem prefira privilegiar a ideia de liberdade enquanto outros valorizam a injustiça por ela gerada. Mário Soares, por exemplo, teme os efeitos sociais desta revolução, enquanto Cavaco Silva prefere sublinhar os ganhos que gera em toda a humanidade. E entretanto, no mundo, estas simples clivagens cavaram fossos gigantes entre os que apoiam o fenómeno e os que o rejeitam.
Terceira ideia: há um caminho alternativo, para o qual o texto do presidente chama a atenção: aquele que potenciando os efeitos positivos do movimento livre, concebe um plano para minimizar os danos colaterais. Le Grand, trabalhista britânico que defende o socialismo de mercado, lembrou o evidente: hoje todos são simultaneamente consumidores, trabalhadores e proprietários (da própria casa, por exemplo). Essa dimensão, concretiza, torna-os globais. E por isso é inevitável que queiram viver em globalização - em interacção permanente e aproveitando essas três dimensões.
Quarta ideia: Valorizar as capacidades individuais, e a possibilidade de as exercitar sem limites geográficos, é um valor notável que faz a balança pesar a favor da globalização. Ou seja, ainda que nada mais fosse acautelado, isso seria melhor do que um mundo dominado por corporações - públicas ou privadas. O que simplifica tudo: basta que se adicione a esta vantagem a cautela previdencial do Estado Garantia para que se olhe a globalização com tranquilidade. Melhor: como uma oportunidade.
Comentário de Elvira Vieira: A globalização veio para ficar. Quer se queira ou não. É um facto consumado a vários níveis, que se encontra em permanente mutação por força do dinamismo dos mercados. A sua importância justifica a maior atenção dos governantes mundiais e a sua negligência pode produzir graves problemas de competitividade.